A Casa de São Matias, da sub-região da Serra da Estrela – Gouveia, para sermos mais exatos –, apresentou-se recentemente, num jantar que decorreu na Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira, com 3 propostas, assinadas pelo enólogo Francisco Gonçalves: São Matias Branco 2014 (40.000 garrafas; PVP 5,99 euros), São Matias Tinto 2012 (12.000 garrafas; PVP 5,99 euros) e São Matias Reserva Tinto 2011 (edição limitada e numerada de 2.934 unidades; PVP 14,9 euros).
Quer o branco, quer os tintos são vinhos distintos, que se impõem aromaticamente e que são frescos no palato.
O São Matias Branco 2014, feito com Encruzado, Malvasia Fina e Bical, tem 12% de álcool e é um vinho fresco, com uma acidez muito equilibrada, muito mineral e frutado. Com aromas a fruta verde, como a maçã e a pera, e uma ‘textura’ cremosa – fruto da batonnage constante – apresenta um final de boca muito interessante. Acompanhou muito bem o carpaccio de lavagante que o chefe Rui Paula preparou para a ocasião.
Misturando Jaén, Touriga Nacional, Tinta Roriz e Alfrocheiro, o São Matias Tinto 2012 revelou-se um belíssimo tinto, à altura dos cannelloni de bacalhau que chegaram à mesa servidos com puré de grão. De tom grave e escuro no copo, este tinto com 13% de álcool leva à boca a fruta madura de vinhas com cerca de 20 anos e taninos aveludados – está bom agora, mas imagino-o ainda melhor com algum tempo de garrafa. O fim de boca é persistente. Elegante e fresco, como pretendia o enólogo, para quem “a acidez é a coluna vertebral dos vinhos” – é o que lhes dá longevidade.
O São Matias Reserva Tinto 2011 – 13,5% de álcool – tem 60% de Touriga Nacional e 40% de Jaén, taninos fortes, notas florais e de especiarias, com um ligeiro fumado, e um palato persistente. O estágio em barricas de carvalho francês novas e usadas dá-lhe uma ligeira tosta. Acompanhou este Reserva uma vitela de leite com ostra e topinambur. Muito bom. Dois tintos muito gastronómicos, mas que também se afirmam sozinhos, a sós com o copo.
A Casa de São Matias estava na posse dos Montenegro há 6 gerações e a família sempre esteve ligada à prática agrícola. O investimento feito agora é de meio milhão de euros, com o produtor a comprar uvas fora. Só castas autóctones. As uvas – Encruzado, Bical e Malvasia Fina para os brancos e Jaén, Touriga Nacional, Alfrocheiro e Tinta Roriz para os tintos – são adquiridas a outros produtores e colhidas em vinhas localizadas entre os 450 e os 550 metros de altitude.
António Montenegro, que partilha o nome com o pai e é um de 8 irmãos –, preconiza “uma abordagem diferente ao mercado” e deste mercado percebe ele, fruto da experiência que acumulou na Sogevinus, onde dirigiu o negócio nacional e as exportações para Angola e Brasil. Não será à toa que um projeto tão recente já está ‘lá fora’, em 3 mercados internacionais interessantíssimos para os vinhos portugueses: Angola, Brasil e Suíça.
Oxalá o projeto dos Montenegro consiga diferenciar-se. Ao fazê-lo estará a honrar o bom nome de uma região que ombreia com os melhores de Portugal no que aos vinhos diz respeito.
Comecei a conhecer o mundo do vinho em 2009 à boleia da minha colaboração com o suplemento “GPS” da revista Sábado – o antecessor do “Tentações”. E foi, já no semanário SOL – publicação com quem ainda hoje colaboro – com pezinhos de lã que comecei a escrever sobre um mundo que é tão interessante como complexo. Escrevi sobre os negócios, a inovação na produção, os novos lançamentos, o enoturismo… e apaixonei-me pelo sector. Na “Roda dos Vinhos”, falo-vos de vinhos e conto-vos histórias à volta do vinho e dos vinhos.